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Nas Águas do G20

Alunos da Escola Municipal Doutor José Antônio Ciraudo/ Divulgação

5

março 2024

por

Silvana Gontijo

O Rio responde à mudança climática inovando na educação em parceria com o meio ambiente. Garantir a sobrevivência da humanidade passa pela recuperação e preservação dos rios, que depende de ações efetivas e imediatas. É o que estamos fazendo

A capital do G20 é também a primeira capital brasileira a recuperar e preservar seus rios a partir do trabalho realizado por suas escolas. O programa Esse Rio é Meu está sendo implementado em todas as 1.556 escolas municipais, atingindo mais de 38.000 professores, 640.000 alunos e 267 rios e córregos. Em parceria com as Secretarias Municipais de Educação e de Meio Ambiente, o planetapontocom conta com o patrocínio da empresa Águas do Rio, que viabiliza essa ação em todo o território carioca, a partir da nossa metodologia proprietária – educação com e por meio de causas.

Muito antes do chamado para a ação que resultou da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas - COP 28, a cidade do Rio de Janeiro já vinha fazendo um apelo pela recuperação e preservação de seu patrimônio hídrico, na prática. O Esse Rio É Meu é um dos maiores e mais inovadores programas de transformação da cultura de territórios em torno de suas bacias hidrográficas.

Sabemos que 80% do lixo que chega ao mar vem dos rios. Trabalhar pela mudança de paradigma das comunidades em relação aos seus rios, recuperando e preservando todo o bioma, nos coloca também em linha com os objetivos da Década do Oceano - 2030.

INOVAR PARA MUDAR  

O planetapontocom há vinte anos tem como missão desenvolver soluções inovadoras para a educação pública brasileira. O programa Esse Rio É Meu faz parte do Cidades, Salvem seus Rios!, um chamado nacional para que os municípios brasileiros trabalhem pela recuperação e preservação de seus rios. A ideia nasceu a partir de uma pesquisa realizada com mais de 4 mil professores para saber qual era a causa que mais poderia mobilizar crianças e jovens no Brasil. O meio ambiente, com ênfase na questão da água, se destacou. A partir daí, passamos a formular a proposta que trouxe essa causa para o centro do processo pedagógico.

A prática nos mostrou que os conteúdos curriculares, quando associados de forma interdisciplinar a uma causa de transformação social no território da escola geram uma experiência significativa para toda a comunidade, principalmente para os estudantes, que atuam como cidadãos e protagonistas dessas mudanças.

O planetapontocom defende a transdisciplinaridade e a interdisciplinaridade como avanços metodológicos na educação pública brasileira, que até hoje ainda ensina cada componente curricular em compartimentos separados. Acreditamos no ensino baseado numa visão sistêmica e integrada, partindo do pressuposto que a criança não constrói sua concepção de realidade em partes isoladas, mas a partir do todo que seus sentidos exploram. Por que, então, a escola não provê uma experiência análoga? Entendemos que a solução é uma metodologia que traga os problemas da realidade do estudante para o centro do processo pedagógico. Estamos falando de educação baseada em problemas e por projetos. Neste caso, quais problemas e quais projetos? A degradação dos rios e sua recuperação e preservação.

COMO TUDO COMEÇOU

Em 2015, como teste, lançamos no Rio de Janeiro o projeto de recuperação do Rio Carioca. Batizado com o nome Carioca, o rio do Rio, a iniciativa envolveu 27 escolas públicas e privadas situadas na bacia do rio Carioca, que nasce na Floresta da Tijuca e deságua na Baía de Guanabara. Durante dois anos, a equipe do planetapontocom aprendeu como articular os problemas do rio com os conteúdos curriculares e com as metas da BNCC – Base Nacional Comum Curricular.

Além da limpeza de sua parte visível em um ano e seis meses, o projeto levou o Carioca a ser o primeiro rio urbano brasileiro tombado como patrimônio histórico e cultural. Inspirou também a redação, aprovação e regulamentação da Lei Municipal 6.535, que estabelece a implementação do projeto Esse Rio é Meu no âmbito de todas as escolas da rede municipal de ensino. O movimento inspirou ainda uma série de produtos culturais. Vídeos, canções, peças teatrais, exposições de pinturas e de fotografias, esculturas com resíduos sólidos reciclados, amplificaram a ação inspirando jornalistas a gerar mais de oitenta matérias em um ano.

O êxito do Carioca, o rio do Rio nos levou ao passo seguinte de sistematizar e disseminar para ganhar escala. E foi assim que esse piloto evoluiu para uma tecnologia social: o programa Esse Rio É Meu, passível de ser implementada em qualquer município brasileiro. O primeiro deles, na cidade que tem Rio no nome e que sai sempre na frente quando a ideia é inovar, nosso Rio de Janeiro. 

  

Hoje estamos trabalhando com todas as escolas e todos os rios e córregos da nossa cidade. São muitos resultados positivos, mas o que mais me enche de orgulho é quando fica nítida a mudança de cultura nos territórios.

“Na verdade, eu não sabia da importância do Rio Acari até recentemente. Quando fomos conhecer de perto o rio, achei estranho. Nunca vi escola estudando na margem de um rio. Mas gostei bastante. E senti uma angústia por não poder resolver o problema ambiental naquele momento. É preciso parar de jogar lixo no rio e desassorear o canal. Nós, jovens, devemos cuidar do nosso lugar, estudando as questões ambientais e buscando resolver esses problemas em conjunto com as autoridades públicas e privadas”, destaca Kayllane de Oliveira Hortêncio, aluna da Escola Municipal Charles Anderson Weaver, localizada em Coelho Neto, Zona Norte do Rio.

A estudante mostrou o impacto positivo do programa ao conquistar o 1º lugar no Prêmio COMDEDINE de Pesquisa Escolar com um poema sobre racismo ambiental. O conteúdo foi criado com base nos aprendizados do projeto. Hoje, Kayllane transformou-se numa ativista defensora da causa da recuperação do seu rio juntamente com sua comunidade.

São muitos outros exemplos, entre eles iniciativas como um podcast, criado por alunos da D. João VI, escola da Zona Norte do Rio. Orientados pela professora Inês Valpaços, a turma Arco-íris EI 51/2023 compartilhou seus aprendizados e os cuidados que precisam ter com a natureza, principalmente em relação ao Rio Faria Timbó, patrimônio hídrico que fica perto da escola.

Já a turma da escola General Osório, em Coelho Neto, mesclou conhecimento e tecnologia e, por meio do audiovisual, falou sobre a importância da preservação dos rios em um curta-metragem. Ainda usando a comunicação e a criatividade, os alunos da escola Senador João Lyra Tavares, em Lins de Vasconcelos, se tornaram jornalistas por um dia e criaram um telejornal temático, incluindo até reportagens relatando o sofrimento que os moradores passam por conta da falta de cuidado com o rio.

Para os alunos da Escola Municipal General Euclydes de Figueiredo, a forma de contribuir com o meio ambiente foi por meio de uma atividade prática, na qual puderam visitar e vistoriar o rio Trapicheiros. Após a conclusão, a turma escreveu uma carta à associação de moradores e distribuiu materiais informativos nas proximidades do rio. Já a turma da Escola Municipal Waldir Azevedo Franco optou por uma abordagem diferente. Realizaram uma passeata, solicitando aos moradores do bairro que se conscientizassem sobre a coleta seletiva para proteger o rio Barão de Capanema do descarte de resíduos sólidos e do esgoto in natura.

A água, como princípio das ações de investigação em atividades escolares, vai muito além de saber onde o rio nasce, seu caminho e onde deságua. Para conhecer de verdade o valor de um rio e participar de sua recuperação é preciso aprender todas as ciências – geografia, matemática, história, física, química, botânica, biologia, língua portuguesa etc. E mais ainda: sociologia, comunicação, informática e cultura digital.

Os patrimônios hídricos, além de exigirem cuidados ambientais, precisam ser lembrados, e esse é também um ensinamento adquirido no programa. Os estudantes do Espaço de Desenvolvimento Infantil Maria do Carmo Souza Piran realizaram uma grande ação de mobilização da comunidade, que resultou em um abaixo assinado pedindo para que a placa do rio Lúcio seja substituída, pois a atual está coberta por pichações e desgastada.

Durante o processo de aprendizagem, os estudantes se tornam multiplicadores dos saberes e conseguem engajar a comunidade em seu propósito. É lindo ver as iniciativas que os alunos desenvolvem para que tenham de volta seus rios.

Recuperar os rios é uma questão de sobrevivência. Mas é ainda mais abrangente do que a garantia de continuar com a vida no planeta. Significa também melhorar a experiência de pertencer a um lugar, um exercício de amor. É como dizem as crianças da Educação Infantil das escolas do Complexo do Alemão: Esse Rio É Meu. Esse rio é seu. Esse rio é nosso!

E o Rio de Janeiro, a capital do G20, a cidade de todos os cariocas nascidos aqui, ou não, teve sua primeira edificação nas margens do rio que dá nome ao gentílico, o rio Carioca. O rio de todos nós.

Silvana Gontijo é jornalista, escritora e presidente da OSCIP Planetapontocom.


Sobre o planetapontocom

O planetapontocom, fundado em 2004, é uma organização que desenvolve soluções inovadoras para a educação pública brasileira, atuando com e por meio de causas. Ao cuidar dos nossos rios a partir das escolas, planetapontocom alia sustentabilidade, entretenimento e educação para contribuir com a formação de cidadãos comprometidos com o planeta. A organização atua por meio de três frentes: o programa Esse Rio é Meu, voltado para alunos do Ensino Básico, a Turma do Planeta, um imaginário lúdico que ensina por meio da cultura, da midiaeducação e do meio ambiente, e a Revistapontocom, uma publicação de vanguarda voltada para educadores.